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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2005

Países temporários

Desde puto que gosto de sentir o espaço recuar à minha volta. Recordo com prazer o fascínio que me inspiravam as orgulhosas multidões de pinheiros passando por mim em sentido contrário, correndo firmes e verticais, ultrapassando casas e montanhas, num pacífico espectáculo marcial.





Tinha dez anos quando comecei a viajar regularmente em transportes públicos. Ainda me lembro bem das velhas carreiras da Rodoviária Nacional, cujos trovejantes motores e rígidas suspensões rapidamente monopolizavam a atenção do utente, em desfavor das vistosas riscas laranja da carroçaria. Muitos anos depois, continuo a apreciar a sensação de habitar, ainda que por breves momentos, esse pequeno monstro instável, sujeito aos caprichos atmosféricos, às ratoeiras da estrada e à perícia do motorista: o autocarro de passageiros. Ali vive-se, enquanto se viaja. É como um pequeno país a deslocar-se. E tudo pode acontecer! Mais tarde hei-de contar-te como me aconteceu apaixonar-me a bordo dum expresso...





Quando acabei o liceu, apaixonei-me também pela segurança e disciplina do mais potente e igualitário veículo terrestre de transportes: o comboio. De facto, salvo algumas batotas, nos caminhos de ferro não há ultrapassagens! Pois é, há classes separadas nos comboios mas, sinceramente, isso não me preocupa muito: ao luxo e à etiqueta prefiro o convívio com as pessoas e a liberdade de pôr os pés no banco da frente. Ups! Vem aí o revisor! Sou um privilegiado por viajar em segunda classe...


estação do Entroncamento


Portugal tem talvez a mais miserável rede de transportes públicos da Europa ocidental, com serviços de baixa qualidade e pouco pontuais, pagos a preços que os construtores de automóveis agradecem. Mas eu gosto, mesmo assim, de andar de comboio. Quase sempre disfruto da viagem sem me preocupar seriamente com mais nada. Esqueço de onde venho e para onde vou. Este feitiço começa naquele lugar impressionante, na magnífica estrutura metálica enxameada de pessoas e bagagem, o limbo onde se cruzam, convergem ou começam os trilhos que levam à esperança e à saudade. O semi-lugar onde tudo começa e acaba: a estação de caminhos de ferro. E o encantamento continua, durante a viagem. Sigo embalado pelo ritmo nervoso das carruagens (que já foi muito mais nervoso!), o deslizar infernal das rodas nos carris, aço batendo no aço, enquanto pessoas, carros, casas, árvores, montanhas e cidades vão ficando para trás. Só este país temporário avança, rasgando a atmosfera. Repara que tudo aqui é mais autêntico nas pessoas, a novidade faz-nos assim. E cada viagem é uma novidade.


estação do Entroncamento


E por mais herméticos e deprimentes que os tornem, nos países temporários sobre rodas hei-de continuar a alimentar a ilusão de que os pinheiros andam mesmo. Pelo menos, enquanto houver pinheiros.


locomotiva na estação de Abrantes

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2005

Na rotunda

Imagina-te numa estrada. Segues e encontras uma rotunda com duas saídas.

Uma das saídas não tem sinais, nem vem nos mapas. A via perde-se para lá duma colina. Às vezes distinguimos um sol, espreitando atrás da curva, outras pressentes um vento frio, cortante, quase cruel. Mas suspeitas da tua lucidez, e sabes que aquele é o lugar onde sonhaste sonhar a felicidade. Aquela é a estrada que queres seguir, é o caminho que desejas tomar, mais que tudo na vida. Tens receio. Pensas que pode ser cedo demais para tomar uma decisão tão importante. Intimida-te e seduz-te.

Vais dando voltas à rotunda. Lembras-te que depois de seguires por um dos caminhos não poderás voltar atrás. As estradas da imaginação têm sentido único, apesar de terem rotundas.

A segunda saída é-te familiar. Estudaste-lhe bem a geografia, não temes já as suas curvas perigosas -- que as tem --, e agradam-te os lugares remotos e tranquilos que uma luz verde te convida a visitar. Enquanto vais circulando pela rotunda, qual ponteiro de relógio, interrogas-te se este não será um caminho fácil demais. Tu que amas a inquietude, que és tu próprio imprevisível, hesitas.

Imagina-te, ponteiro rodando na rotunda. E nas rotundas da vida circula-se no sentido horário, convém lembrar. Suspeitas que nenhuma das duas estradas alguma vez regresse à outra. Jamais irão convergir. Deves pois optar. Ou não. Diz-me: que farás?

Um dia dir-te-ei o que fiz.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2005

"Eu temo o que quero e quero o que temo"

O medo. O medo faz parar. Recuar. O medo conserva. Nunca conquista. Só recebe. Nunca dá. O medo é frio. É escuro. O medo acelera o ritmo cardíaco. O medo é por vezes filho do desejo. E por vezes mata-o. O medo faz tremer. Faz suar. O medo nunca matou ninguém. Mas arrefece as mãos. E os sentimentos. O medo é forte. Persistente. O medo é fácil. Mas arrasta-se pelo chão cheio de vergonha. O medo esconde-se à sombra da sensatez. É ponderado. Prudente. O medo sobrevive. O medo não sabe viver. O medo não pode viver.

Vive. Sê feliz.



terça-feira, 15 de fevereiro de 2005

Divagações académicas

Uma frase interessante:

No país das maravilhas, os estudantes estão revoltados com as propinas exageradas que pagam anualmente.

Outra:

Domingo há eleições no país da maravilhas.

Pela lógica do bom senso, as duas afirmações anteriores deviam originar a seguinte:

Os estudantes do país das maravilhas exigem aos partidos políticos que clarifiquem as suas posições sobre a questão das propinas, para poderem decidir em conformidade no dia das eleições.

Mais:

Exigem que que os partidos se comprometam a acabar com a roubalheira.


Desgraçadamente, no país das maravilhas (que, a propósito, não existe, é pura ficção) os estudantes só sentem vontade de fazer barulho quando o leite já está derramado. Ou quando há cerveja em promoção. Para dizer a verdade, eles nunca sentem grande pica pra essas coisas. Além disso, a iluminada elite dos dirigentes académicos anda por estes dias muito ocupada... É que domingo que vem há eleições no país das maravilhas.

Saudações académicas.





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