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sexta-feira, 29 de abril de 2005

Vou cair

Dizem que vou cair

Porquê a insónia?
Porquê o sol
se as nuvens se condensam?

O destino é delicadamente
subtil
como a deriva de um continente
Nunca dorme Não sabe ser
conveniente

A mentira convincente pode ser
confortável
mas eu quero-te
verdade inverosímil

Segredo

Porque o medo deita-se cedo
mas não consegue adormecer

Adelino



terça-feira, 26 de abril de 2005

Livros, livros, livros

Resolvi aderir ao questionário livresco da nossa blogosfera. É que isto é giro. Primeiro, porque acabamos por conhecer um pouco das pessoas que vamos encontrando pela Internet. Humanizando-as. Isso é muito importante. Depois, porque vamos dando aos outros sugestões. Quem não gosta de recomendar a alguém algo que apreciou?

Portanto, cá vai:

1 - Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Eu não quero nem queria ser um livro. Mas se tivesse mesmo que ser, então seria um livro de poemas de amor, da minha autoria. Já viram isto, um livro autor de si mesmo? E o primeiro poema seria o do artigo anterior, dedicado a uma mulher... que me ilude.

Isto independentemente de alguém querer queimar o livro (Fahrenheit 451), ou a mim. As Inquisições só queimam o que não podem matar. O amor e a liberdade são imortais.

2 - Já alguma vez ficaste apanhadinha(o) por uma personagem de ficção?
Lembro-me do protagonista de "O Fio da Navalha", de W. Somerset Maugham, que li quando a barba ainda estava a começar de me aparecer na cara. Larry era um rapaz com tudo para ter aquilo a que se chama uma vida de sucesso: uma carreira, uma mulher que o amava, uma família que o apoiava. Mas ele não quis o fácil, o óbvio. Numa aparente loucura autodestruidora, Larry quis testar os seus limites, descobrir o mundo. Descobrir-se. Este romance, e esta personagem em particular, marcaram-me bastante, embora o Larry não seja "o meu herói".

Quem não é certamente a minha heroína é a Kate, de "A Leste do Paraíso", de John Steinbeck. Mas impressionou-me e de que maneira, a forma extraordinária como o autor conseguiu criar uma personagem tão perfeitamente maquiavélica na perseguição dos seus objectivos. Kate é a (quase?) total ausência da ingenuidade que nos faz sociáveis e humanos. Toda uma vida de actos premeditados, sem afecto, nem piedade. A pessoa mais cruel que eu já li.

Além do Larry e da Kate, lembro-me dos dois protagonistas de "A Insustentável Leveza do Ser", de Milan Kundera (Tereza e Tomás, se bem me lembro), apaixonados, em luta com a hipocrisia do Estado e da sociedade.

3 - Qual foi o último livro que compraste?
"Microelectronics Circuits", de Adel Sedra e K. C. Smith. Ah! Ah! Puro terror da primeira à última página!

Infelizmente, eu não costumo comprar livros. Quando penso nisso, a minha carteira diz-me que são caros. No entanto, sou cliente habitual das bibliotecas públicas.

4 - Qual o último livro que leste?
"Dádiva Divina", do Rui Zink. Que me desiludiu um bocadinho, confesso. Aquele desenlace deixa muito a desejar. Há ali detalhes que, enfim... Mas, de resto, um policial muito bem escrito, irónico, moderno, à Rui Zink.

5 - Que livros estás a ler?

Estou a reler a antologia "Poesia Completa", de Miguel Torga. É um reencontro com o primeiro poeta que li voluntariamente, o que me causa muito prazer e emoção. E enquanto mato as saudades, selecciono alguns poemas para publicar brevemente no beco.

6 - Cinco livros que levarias para uma ilha deserta.

Se eu fosse viver para uma ilha deserta, não levaria livros, levaria uma pessoa (Há voluntárias? Eu disse voluntárias...). Se eu fosse viver para uma ilha deserta, e pudesse levar livros, levaria um manual de sobrevivência. Acho que ia precisar... Ia custar-me mais a ausência de pessoas do que a ausência de livros. Ainda assim, talvez fosse importante levar uns cadernitos e umas canetas. É que quando estou só, tenho tendência para escrever muito, e não me parece boa ideia escrever nas paredes das cavernas.

...

Huuum, tá bem, a ideia da pergunta era eu dizer que cinco livros levaria, se tivesse que levar cinco livros. Então, levava:

"A Insustentável Leveza do Ser", de Milan Kundera;
"As Vinhas da Ira", de Steinbeck;
"1984", de George Orwell;
"O Ano da Morte de Ricardo Reis", do nosso José Saramago;
Uma gorda antologia poética que incluísse, obrigatoriamente poemas de Eugénio de Andrade, Miguel Torga, Sophia de Mello Breyner, David Mourão-Ferreira, Fernando Pessoa (que ainda não conheço tão bem quanto dizem que merece) e toda "A Invenção do Amor e Outros Poemas" de Daniel Filipe. Mai nada.

7 - Três pessoas a quem vais passar este testemunho e porquê?
Passo o testemunho a quem, depois de ler isto, queira fazer o mesmo. Como eu fiz (li aqui). Mas também espero que leiam isto mais do que de três pessoas (querias...)! Mas serão certamente pelo menos três, as que o farão.

O porquê ficou dito no início.

Hasta!

segunda-feira, 18 de abril de 2005

Definições

Que é o amor senão
a suprema ilusão?

E a razão o que é
senão disfarce absurdo da fé?

Eu iludo-me.

Adelino



segunda-feira, 11 de abril de 2005

Censura

O meu cérebro já possui um filtro que barra a entrada a disparates. O dispositivo já vem de origem, mas eu gosto -- não quero cá concorrência.

Estou é a pensar em fazer um upgrade ao software, a ver se consigo implementar uma firewall e um anti-vírus. quando conseguir, ah, quando o sistema estiver a funcionar, meus amigos, toda a informação proveniente de:

i) televisão;
ii) internet;
iii) jornais;
iv) revistas;
v) livros;
vi) doutores;
vii) engenheiros;
viii) funcionários;
ix) meninas de olhos bonitos;

Terá os dias contados.
Será. Tudo. Tão. Sim. Ples. Mente. Per. Feito.

segunda-feira, 4 de abril de 2005

Your time is running out

O caso é que ando a arrastar-me dolorosamente por uma zona complicada da minha existência. Como eu tenho pena da malta que tem tido o mau gosto de me aturar nos últimos tempos. Não deve ser nada bonito de ver, não senhor. Mas, então o que se passa, perguntarás. Resumindo numa frase, se calhar a rotunda é só uma curva, a curva imediatamente antes da recta final da minha juventude.

Desde que sei pensar (?) que sou gajo para ter ideias originais ou, pelo menos, pouco convencionais. Por exemplo, sempre odiei solenemente a ideia de ter uma profissão aborrecida, uma rotina chata (desculpa a redundância), um horário, meu deus, um horário! Quando eu tinha dezasseis anos, desenhava o futuro de forma simples e vaga -- i.e, perfeita: tirar um curso superior, arranjar um emprego bem pago, ganhar uma pipa de massa em meia dúzia de anos, depois pôr uma mochila às costas e partir à descoberta do mundo. De preferência acompanhado da mulher da minha vida. Férias vitalícias. Que bonito! Dez anos depois...

Ah, enganas-te! Dez anos depois, nada mudou. Continuo o mesmo inadaptado, o mesmíssimo utópico. As utopias variam um bocadito, evoluem, mas o espírito é o mesmo. Assusta-me quase sempre vagamente o facto de não me preocupar absolutamente nada com a perspectiva de eu ser um falhado em potência. Mas, por vezes -- e é o caso presente, amiga blogueira --, por vezes fico em pânico. Há dez anos atrás, se queres saber a minha opinião, eu era um puto banal, tímido, embora irrequieto, irritante até, de ideias a tender para o simples, mas muito pouco influenciável. Mesmo muito pouco. Agora, sinto-me a perder isso, a perder a minha independência!

Que bizarro. Pensando bem, tudo isto é óbvio. A verdade curta e grossa é que estou a ficar velho (leia-se adulto). No entanto (e segue-se uma confissão muito delicada), tenho mais medo da reacção das outras pessoas em relação a isso, do que propriamente das implicações físicas ou mentais que isso me traga directamente... Lá está: influenciável. Deixei o meu planetazinho ideal à prova de bala, à prova de tudo, e caí de cu na realidade.

Deixa-me contar-te uma. Imagina que um dia destes fiquei revoltadíssimo quando vi um escuteiro, fardado, pois claro, que seguia com os seus camaradas numa excursão, no mesmo autocarro que eu (de autocarro, pois claro), divertidíssimo, o estafermo, a destruir a porcaria do regulador de ar condicionado do lugar dele. Epa, subiram-me cá uns calores! Mas calei-me, eles eram muitos (muitas, sobretudo, ah, ah). Mas francamente, um escuteiro! Um escuteiro nunca mente. Um escuteiro ajuda velhinhas a atravessar a estrada. Um escuteiro faz pelo menos uma boa acção por dia. Eu acho que não me estou a fazer entender. A sério. Eu detesto escuteiros. Ou melhor: eu detesto os escuteiros, o grupo. Tal como detesto o exército. O problema é que normalmente eu ficaria a rir-me da situação e, se tivesse uma câmara de vídeo à mão, aquilo seria notícia de abertura do telejornal. "Grave crise no Corpo Nacional de Escutas, despoletada pela destruição de um autocarro da Rede de Expressos por um escuteiro em fúria. O indivíduo em causa tinha já antecedentes criminais, nomeadamente..." Com exageros e tudo. Mas não, bolas! Em vez de me divertir cínicamente, deu-me para uma de moralizar. Um escuteiro, ainda por cima, valha-me deus!...

De modo que estas reflexões me têm deixado pouco tempo (paciência?) para a prosa. Terá sido isso e...



5ª Edição!


Este também deu algum trabalho, embora menos. Não foi assim nada de especial.

...

OK, eu não sei mentir, tenta esquecer o que leste até agora. Tudo isto são desculpas. A razão pela qual eu não tenho escrito no blog é o facto de eu ter passado um mês inteirinho a ouvir o Shoot Down dos Prodigy (com os irmãos Gallagher, dos Oasis), em altos berros, umas quinhentas vezes por dia. É claro que fiz uma pausa para recordar os Ornatos :) mas, sinceramente, já nem me lembro das músicas deles que, a propósito, adoro. "Shot the gun / Shot the gun to the bang, bang, bang / Shot the gun / Shot the gun to the bang, bang, bang / ... / Too many tied to the / Too many tied to the bang, bang, bang / ... / Your time is running out", é tudo quanto sei. Vago, simples e hipnótico, como (me) convém. Perfeito. Além de que (outra confissão), a minha rotunda tem afinal um monte de saídas, e eu resolvi ir por todas ao mesmo tempo...

Agora uma palavrinha para ti, que provavelmente és a única pessoa que terá curiosidade para ler isto tudo até ao fim: obrigado pelo protesto. Deu frutos. O texto ficou uma bela merda, sem dúvida, e fiz um enorme esforço para parecer lunático -- normalmente isso é espontâneo! Mas nem tudo é mau. Graças ao empurrãozinho, por ter dito estas banalidades já me sinto melhor. Desabafei. Estou confiante. Sinto-me mais maduro.

Mais... adulto.

...

Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaah!!!...

;)

(Obrigado. Um beijinho.)



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