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a agoirar desde 2004

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quinta-feira, 30 de dezembro de 2004

Ordeno-te que nunca me obedeças!

Chega aqui ao pé de mim, tenho uma coisa pra te dizer. Senta-te aqui. Dizem que hoje está frio, mas estou com um calor do caraças. Isto não é normal, devo estar com febre. Velho? Achas que estou velho? Tás mas é doido, puto! A mania que esta malta nova tem de achar que o melhor do mundo é ser jovem... Já no meu tempo era assim. Ingénuos.

Sabes puto, eu já não acredito na juventude. Nem nos adultos, para ser sincero. É tudo um grande rebanho de paus-mandados. Porquê? Tens quase dezoito anos e ainda tenho de te explicar porquê? És um pau-mandado, um doce cordeirinho, porque há pessoas que mandam em ti, fazem de ti o que querem e tu deixas. Decidiram a tua vida mesmo antes de tu nasceres, moldaram-te a personalidade. Periodicamente, dão-te a ilusão de controlares o teu futuro, mas é só a fingir. Um torrãozinho de açúcar de quando em vez e o serviço está feito. Domesticaram-te. Sabes, o ser humano deve ser selvagem. Eu não acredito na juventude, pelo menos nesta. Sim, meu querido, admito: fui eu que te fiz assim. Acho que não tive forças para fazer melhor. Fez-me falta a tua mãe... ainda faz. Ela sim, era uma mulher determinada, fazia-me acreditar que podíamos mudar o mundo. E podíamos!

Quando eu me apaixonei por ela, era mais novo que tu, ela era linda, tinha uns cabelos negros que enfim, nem sei descrever, não sou poeta. Ela já simpatizava comigo e achou piada ao meu embaraço quando a via. Pois resolveu ajudar-me! Ela era assim, gostava de ajudar os outros, gostava de toda a gente. Aprendi isso com ela: dar o benefício da dúvida, partir sempre do princípio que as pessoas não nos querem mal, que são boas. Levou alguns pontapés, mas foram poucos, infelizmente. Não teve tempo para mais. E então ela ajudou-me. Um belo dia viu-me sozinho no jardim, aproximou-se, eu quase fugi quando vi o olhar dela! Sentou-se ao meu lado, olhou o céu a sorrir, perguntou-me se na minha terra o sol era assim tão quente e eu acalmei um pouco. Não teria tempo, mesmo que quisesse, de responder. Ergueu o braço direito, pôs a mão no meu ombro esquerdo (devo ter aqui algum botão de "start"), olhámo-nos quase sem atmosfera pelo meio e... meu caro, foi tão único, tão suave, tão perfeito, que tive a ilusão de ter sido eu a seduzi-la.

Não, não, não! Não quero saber nada das tuas namoradas, puto! Eu já não aprendo nada com isso, guarda essas novelas para os teus filhos. Se te deixarem ter filhos. Mas por que raio te sentaste no chão, quando tens aqui uma cadeira? Senta-te aqui. Ao meu lado há sempre uma cadeira vazia, meu filho. Ou por outra, deixa lá. No fundo, sujar as calças é o que te resta de irreverência. Deixa lá, não te vou tirar isso. ... Sabes, se eu tivesse a tua idade e o meu velhote me dissesse que não se importava que eu continuasse a emporcalhar as calças, eu levantava-me logo do chão. Fiz-lhes a vida negra, aos meus velhos. E eles não foram lúcidos o suficiente para me agradecerem, não aprenderam nada! Ri-te, ri-te... gosto de te ver feliz. Agora velho, a chamar-me velho, o pirralho...

Velhos são os previsíveis, aqueles cujo presente mais não é que a repetição do passado, aqueles a quem as previsões dos astrólogos servem que nem uma luva. Eu nunca fui assim. Posso ter muitos defeitos, e tenho, mas tento ser original. Ter futuro. O quê? Tens razão, poucas pessoas estão preparadas para aturar um tipo como eu. Somos educados para ambicionar segurança e desprezar a aventura. Riscos sempre calculados. Até que a morte nos separe. Tu também pensas assim, não é? Mas isso não quer dizer que eu esteja enganado...

Está na hora, não é? Eu não sei, não tenho relógio, sempre evitei habituar-me demasiado a esse monstro. Só falei porque te vejo impaciente. Ela vem aí, não é? Bem me parecia. Nem penses pá, não quero conhecê-la! Apresentas-ma só depois de fazeres amor com ela. Oh diabo, não é preciso corares! Nem vou querer que me contes nada. Aliás, essas coisas fazem-se notar sem serem ditas...

Espera, antes de ires, quase me esquecia do que te queria dizer. É só um segundo. Vou-me levantar que isto é importante. De velho para jovem, de pai para filho, de homem para homem (será que também tens um botão no ombro esquerdo?). Olha-me nos olhos e ouve bem...

quarta-feira, 22 de dezembro de 2004

A divisão

Oito pares de sóis radiam sobre nós. E há oito janelas para o labirinto. Muitos pensam que são portas, mas não, são janelas. As cortinas foram fechadas. Muito conveniente. O crescente jaz sobre a mesa e a seu lado um relógio empurra vagarosamente o ponteiro dos segundos.

Dos dedos dos autómatos saem segredos. Pelos olhos e ouvidos entram subtilezas que, a espaços, activam leves sorrisos.

Aqui as rectas são rectas, direitas, limpas. Tendem mesmo para o infinito. Os círculos são mesmo circulares e ferem os olhos de tão perfeitos. Só as máquinas fingem combater o silêncio, e fazem-no com a discreta competência de assassinas profissionais.

A divisão está fechada. Apesar disso existe uma porta por onde muitos entram, pensando que de facto entram, quando na verdade saem. Vindo do lado de fora, sente-se um rumor fresco que dói no peito de quem o ouve. Através da brancura hermética da geometria da cúpula, passam subtis pedaços de alucinação. Por vezes há autómatos que descodificam esses sinais. Há autómatos que se perdem.

Diz quem viu, que o gerador de tais sobressaltos é um ser bioquímico que se deixou de filosofias e quis ser mais escravo que os activistas autómatos. Uma fêmea, como é referido nos livros antigos. Também, agora todos os livros são antigos.

E por vezes há autómatos que descodificam esses sinais. Há autómatos que se perdem.



terça-feira, 21 de dezembro de 2004

Porquê?

Porquê começar um blog? Que raio de ideia foi esta de me querer pôr a mostrar aos outros aquilo que penso e sinto? Afinal, o mundo vive bem melhor sem conhecer as minhas ideias. Ah! É isso: o mundo vive bem melhor sem conhecer as minhas ideias... Achei o argumento que procurava.

Na verdade, isto começou quando (por sugestão da própria autora, que eu nem ligava muito a estes sites) fui ler o blog duma menina simpática (há sempre uma menina simpática por detrás das coisas idiotas que um gajo faz) e o quis comentar: para o fazer, fui obrigado a registar-me, e logo ali tive a ideia... fazer um blog!

Depois, comecei a tentar descobrir justificações sérias para isso, mas essa parte já contei.



sábado, 18 de dezembro de 2004

Três, dois, um...

Começou!

Sobre o blog

O blog

O Blog do Gato Preto nasce na ingenuidade e no improviso, lá bem no alto da minha arrogância. Da necessidade de afirmação pública das minhas convicções, das minhas dúvidas, das minhas paixões. Tão simples quanto isto.

Ainda vos digo que, mais que o órgão oficial da minha revolta, a revolta que sinto e que sinto ter o direito de ter, o Blog do Gato Preto é uma partilha. Jamais será este site a voz de outro que não eu. Querendo, muitos facilmente me situarão num qualquer ideário, político ou social -- estão no seu direito e, possivelmente, terão razão. Mas não me interessa. Estou-me nas tintas. Sempre preferi os labirintos às auto-estradas. Interessa-me, apenas, escrever como quem realmente sou. Quero a reflexão e a arte. Interessam-me no Blog do Gato Preto aqueles que buscam dúvidas para as suas certezas inabaláveis.


O autor

O autor vai falar de si na terceira pessoa, porque prefere que falem dele em vez de falar de si próprio. É extremamente modesto.

Nascido na lusa Aeminium há luas suficientes para pensar que já não é obrigado a aturar certas merdas, vai, até ver, aturando algumas. Porque se não comer, morre, é uma lei da vida. Depois de nascer, acho que não foi logo depois, inventou o amor e fez muitas asneiras, não necessariamente por esta ordem. Leu Torga e decidiu ler mais Torga, descobrindo que, às vezes, a poesia de um génio, semeada em campos inóspitos, floresce. O Padre Eterno era já finado quando o autor do blog leu Steinbeck e Hemingway, mas a sua falta já deixara de ser sentida. Passado é passado. Recordação, apenas a do ano de 1984, o trágico porvir que o generoso Eric Arthur viu e que vê quem quiser.

Amador sempre, ainda que lhe paguem, o Gato Preto é graduado em coisa nenhuma pela universidade da vida. Luzes da Ribalta, do saudoso Chaplin, é o filme da sua vida. Isto fica aqui bem, e toda a gente tem um filme da sua vida, não se pode ser diferente em tudo. Só dizer que adora Jorge Palma, o grande Jorge Palma, com quem se embebeda frequentemente sem que este saiba, e tem uma adoração quase canina por Pink Floyd. Até às estrelas, nas asas de um porco.

Nos dias que correm, é vê-lo por Lisboa, onde trabalha e vive. É vê-lo por lá, diz ele que a fazer menos asneiras, dedicando-se aos seus projectos e reinventando o amor.


Os direitos dos autores

VITOR HUGO / GATO PRETO

É permitida a cópia, distribuição e exibição de todo o material da autoria de Vitor Hugo / Gato Preto presente neste blog, apenas nas seguintes condições:

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    Vitor Hugo
    http://blogdogatopreto.blogspot.com/

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Quaisquer condições acima podem ser revistas ou revogadas, desde que obtida permissão por parte do autor do Blog do Gato Preto, contactável em vitorhfd@gmail.com.


OUTROS AUTORES

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